quarta-feira, maio 30, 2007

História de Encantar VIII



Andavam sempre juntos.
Gostavam ambos de apanhar aqueles raios de sol que iluminavam o campo trigueiro agora em pousio.
Por vezes subiam o afloramento que jazia à beira de um dos limites do terreno.
Uma vez lá, contemplavam ao longe a cidade.
Sabiam que tinham por lá uns familiares.Familiares que tinham emigrado para a grande cidade há muito tempo.
Era sonho deles deixarem o campo e irem ver a cidade.
Por vezes esgueiravam-se ao bloco granítico durante a noite.
Ali se quedavam trocando o cintilar das estrelas do céu, por aquelas luzes coloridas dos neons da cidade.
De mão dada faziam planos futuros.
Entre ais e suspiros trocavam amorosamente românticos beijos.
Certa noite decidiram que tinham de ir à cidade.
Tinham que pôr para trás, aquele receio de atravessar aquela auto-estrada barulhenta, que separava o campo da grande cidade.
O anseio, superou aquele medo medonho provocado por aqueles camiões e automóveis que circulavam naquela via rápida.
Resolveram que fariam a travessia pela manhã.
Um pouco depois do astro rei espreitar por trás do pinhal.
Aconchegaram-se um ao outro.
Por vezes um arrepio sulcava-lhes a espinha.
Não era do frio. Era aquele temor próprio de quem vai partir para a grande aventura.
Adormeceram. Um sono leve como seria de esperar.
Começou a nascer o dia.
Ele suavemente acordou-a com um leque de beijos na sua pequena cabecita.
Ergueram-se e rumaram ao seu sonho. A Cidade!
Chegados à berma da auto-estrada aperceberam-se que já havia demasiado movimento quer de um ou do outro lado da via.
Estremeceram. Mas já nada os podia fazer voltar atrás!
Aguardaram que não viesse nenhuma viatura para fazerem o primeiro lance da travessia.
O objectivo era chegar até ao separador da auto-estrada.
Ela, num impulso arrojado, larga a mão do seu companheiro e lança-se numa corrida frenética tentando alcançar o outro lado.
Porém não se apercebeu daquele auto-tanque que desabrido avançava em direcção a si.
O resfolgar daquela centenas de cavalos paralisou-a.
Aqueles rodados enormes aproximavam-se cada vez mais da cauda verde e sarapintada de bolinhas vermelhas e brancas, daquela jovem lagartixa.
O lagartixo, apercebeu-se que a sua amada ia ser triturada por aquela enorme máquina.
E num acto de louco amor, lançou-se em direcção à sua amada, puxando-a veementemente, salvando-a de perder a sua linda cauda sarapintada, quiçá, a própria vida.
Ela horrorizada viu o seu mais que tudo, ser decapitado por aquela roda negra gigante que por pouco não a ceifou.
Não podia ficar mais tempo ali.
Com dificuldade regressou ao seu lar no campo.
Sabe-se que morreu de velhice, sem nunca mais ter ido ver as luzes da cidade.
Olhava o céu à noite.Sabia que em alguma daquelas estrelinhas, estaria esperando por ela, o seu amado e corajoso lagartixo.

Moral da história: Por um bonito rabo muitas vezes se perde a cabeça

1 comentário:

Anónimo disse...

Adorei esta !
Quem não perde a cabeça por um bom rabo?